Com inspiração na violência que se espraia pelas ruas da Cidade Maravilhosa.
O grito
A noite dissemina amargura no pensamento errante. Rua gigante apequena-se, intimidada pela incógnita que presume no ar. Um minuto passa... depois outro e mais outro... De repente, um órfão do Amor irrompe na calçada que transpira pânico. Com máscara protetora pendente em pescoço suado, a fera urra palavrões. Calor sem camisa. Canivete preso à cintura. Atrás dele, a sirene da Polícia. Adultos correm. Portas e janelas fecham-se. Há corpos que se jogam ao chão, por medo das balas perdidas. Esgueiram-se os gatos na sarjeta. Latidos fogem com os rabos escondidos entre as patas traseiras. E o monstro avança. Nas mãos, pedras e pedradas. Olhar de ódio e perdição nos olhos drogados. Ameaça. Bravura infiel de pecado ambulante.
Procura o quê ou a quem procura?
Que mãos poderosas conseguirão evitar
as ações impiedosas desse filho do nada?
Um carro passa e acelera o passo. Desgraça certa. E havia a criança sozinha no asfalto da fome. Calada e jururu.
- “Saia da frente, seu arrombado!” - vocifera a indiferença cruel do meliante.
A criança assustada movimenta os pezinhos de lá para cá, sem saber para onde ir. Tímida e medrosa, atrapalha ainda mais o caminho da violência, que, sem dó nem piedade, interdita-lhe de vez o futuro. Pedrada na têmpora.
Um grito. Dor lancinante. O luar estremece.
Como pode a flor da Primavera
orvalhar tanto sangue?
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- “Depois que pariu, minha mãe me enrolou num trapo velho e me deixou na caçamba de lixo que ficava do outro lado da rua. Quem viu contou. O safado que me tirou daquela sujeira me fez de mulherzinha dos 6 aos 11 anos. Apanhava e sangrava todos os dias.” – conta o malfeitor, ao ser capturado.
- “Cresci e fugi. Andei largado pelas ruas da Zona Sul do Rio de Janeiro e passei fome e frio, mas, escolhi ser homem.” – bate no peito aprumado.
Escolheu ser homem... um homem desencantado com a vida.
Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Rio de Janeiro, 30 de novembro de 2020 – 18h
Obra: “O Grito” - Edvard Munch
Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Enviado por Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz em 05/12/2020
Alterado em 05/12/2020
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