O TRÁFICO DE ÓRGÃOS EXISTE
Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
De acordo com o art. 1º da Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, permite-se, em solo brasileiro, a disposição gratuita de tecidos, órgãos e partes do corpo humano, em vida ou post mortem, para fins de transplante e tratamento. Sendo assim, a doação de órgãos é gesto altruístico - movimento expressivo de amor ao próximo - que salva vidas humanas. O parágrafo único do dispositivo estabelece que não sem compreendem entre os tecidos: o sangue, o esperma e o óvulo.
Lembro-me que na década de 80 não era difícil abrir o Jornal Balcão, do Rio de Janeiro, e verificar anúncios de vendas de órgãos como forma de resolver problemas financeiros urgentes. Hoje, conquanto vedado por lei o mercado humano existe. Médicos indianos, além do pioneiro C. T. Patel, contribuíram para a disseminação da idéia dos rewarded donors - doadores recompensados ou pagos. No Congresso de Ottawa, Reddy foi dramático ao justificar as razões da utilização do sistema de compra e venda para resolver seu problema de falta de órgãos: to buy or let die - comprar ou deixar morrer. (GARRAFA, Volnei. O mercado de estruturas humanas. Bioética, Brasília, v. 1, n. 2, p. 118, 1993. Simpósio: Pacientes Terminais).
Por exemplo, pode-se citar no Comunidade de Comunidades Virtuais (INFORUM), as ofertas abaixo, também noticiadas em Atibaia Classificados, ambos acessados em 19 de maio de 2007:
“Sou da cidade de Bauru, interior de São Paulo e por motivos de extrema necessidade financeira estou disposto a vender um de meus rins. Tenho 25 anos, completamente saudável e sem envolvimento com drogas ou álcool. Meu sangue é A+ e tenho disponibilidade de viagem imediata para qualquer lugar”. Preços e demais condições serão combinadas pelo e-mail vendorim@yahoo.com.br “
“Olá, não sei mais o que fazer tenho 2 filhos e preciso muito de ajuda financeira pois um deles tem síndrome de West adquirida com 3 dias de vida após uma pneumonia, tenho que terminar minha casa e ter um meio de transporte para que eu possa estar fazendo o tratamento para que eu possa estar fazendo dele, por isso estou fazendo de tudo que eu posso ate vender um dos meus rins e ou partes de outros órgãos (fígado/pulmão/córnea), só entrem em contato quem realmente tiver disposto a me ajudar pois estou fazendo uma troca de necessidade de saúde, tenho 31 anos, não bebo e sou bem saudável e forte.”
A revista Época, na Edição n. 414, de 24 de junho de 2006, seção Medicina, abordou o tema em reportagem intitulada “Supermercado de órgão”. O Brasil, por sua vez, teve destaque negativo em artigo divulgado no site: http://www.elmundo.es/cronica/2004/429/1073310910.html, que o relacionou como um dos países onde o tráfico de órgãos é mais comum.
Difícil estabelecer o valor de um órgão, mas os dados de que se dispõe são assustadores. Em Calcutá, por exemplo, em 1993 anunciava-se a operação completa de transplante por cerca de 30.000 dólares, mas o fornecedor do órgão recebia somente dez por cento, enquanto o saldo ia para a clínica, para os cirurgiões e para os intermediários (BERLINGUER, Giovanni. Corpo humano: mercadoria ou valor? Estudos Avançados, São Paulo, v. 7, n. 19, p. 174, 1993).
Nesta seara, infelizmente pessoas sem escrúpulos agem disseminando mentiras. As "lendas internéticas" inauguraram seguidores. Quando meus filhos encontravam-se na adolescência assustei-me com algumas delas, que mais tarde foram notícias em jornais de grande circulação. Lembro-me do "Boa-noite Cinderela". Era final de semana e os três estavam na casa do pai, quando recebi um e-mail trazendo a informação. Imediatametne telefonei-lhes, apavorada, a suplicar que nada bebessem proveniente das mãos de estranhos. Outras mensagens deixaram-me inquieta. Mas, quando surgiu a história da retirada dos dois rins de uma única vítima, que após a "intervenção" era colocada numa banheira repleta de gelo; e da escrita em baton no espelho, alertando que a pessoa fosse imediatamente levada para o hospital... bem, foi demais para mim. Aos 23 anos de idade passei por duas cirurgias renais (processo bilateral) e para além disto sou irmã, cunhada e tia de médicos e cientistas. Portanto, se acreditasse nessa, seria demais!
Contudo, no relativo ao tema Mercado de Órgãos ou Tráfico de Órgãos, anos seguidos objeto de estudo da minha Monografia da Graduação e da Dissertação de Mestrado, penso diferente, por base em incansáveis pesquisas. O mercado humano é, nas palavras de Volnei Garrafa, muito antiga, tendo sido apenas aprimorada na era dos transplantes, quando avançou de questões mais amplas como a escravidão, prostituição ou exploração física do trabalho, para aspectos mais sutis, delicados e específicos de compra, venda ou aluguel de órgãos e estruturas do corpo das pessoas. (GARRAFA, Volnei. O mercado de estruturas humanas. Bioética, Brasília, v. 1, n. 2, p. 115, 1993. Simpósio: Pacientes Terminais).
Em 1987 o médico Roosevelt de Sá Kalume, denunciou que o hospital-escola da Faculdade de Medicina de Taubaté subvencionava a eutanásia em pacientes comatosos em hospitais do Vale do Paraíba para a aquisição de rins transplantáveis, enviados a instituições de São Paulo, a saber, o Hospital das Clínicas da USP, para pacientes que estavam na fila de espera. Esta realidade golpeia a classificação de res extra commercium decretada ao cadáver, generalizando o pânico entre as pessoas que passaram a temer serem as próximas vítimas ou serem obrigadas a tomar “a injeção da meia noite”, ao presumirem suas vidas ceifadas para a comercialização dos corpos. (QUADRILHA é suspeita de tráfico de órgos. O Globo, Rio de Janeiro, 22 fev. 1997. O País, p. 10)
Absolvição em 1988, pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo:
Apesar da decisão Roosevelt Kalume não se calou.
Obra do Dr. Roosevelt Kalume, 1993
O programa de transplantes era tido como parte de um suposto convênio entre a faculdade de medicina da Universidade de Taubaté (Unitau) e o Hospital das Clínicas (HC) da Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista. Mas, segundo o então diretor, esse acordo jamais existiu. “Eu era o diretor da faculdade e esse programa [de transplantes] era feito por médicos subordinados administrativamente a mim e eu não sabia do programa e quando eu tomei conhecimento eu fiquei com medo”, diz Kalume, que está com 63 anos.
Kalume também dissera que a equipe médica envolvida falsificava diagnósticos de morte encefálica para convencer as famílias dos pacientes a autorizar a retirada dos órgãos. Em alguns casos, continua o denunciante, uma espécie de médium foi apresentado pelos médicos aos parentes para dizer que havia entrado em contato com o morto no plano espiritual e ele havia pedido para os familiares autorizarem a retirada de seus rins. Expressa Kalume: “Era um programa de retirada de órgãos de pacientes comatosos [em estado de coma] para mandar para clínicas particulares de São Paulo.”
O fato mais grave nessa história, segundo Kalume, é que os pacientes estavam vivos e não mortos: “Os pacientes tinham os órgãos retirados, mas eles tinham fluxo cerebral. Eles não estavam enquadrados no conceito de morte cerebral ou no conceito de cadáver. Radiografias revelaram que havia atividade cerebral”, diz o médico. Em outras palavras, morreram porque tiveram esses órgãos retirados.
Segundo o CFM, morte encefálica e morte cerebral são sinônimos. Apesar de os anos 80 não terem tido uma legislação específica para transplantes de rins no país, o recomendado era seguir as normas da Associação Médica Mundial. Ela determinava a retirada de órgãos de pacientes com morte encefálica (sem atividade cerebral e sem respiração natural).
Kalume, por conta das acusações, foi afastado do cargo de diretor da faculdade na época. Atualmente, trabalha como cirurgião de tórax no Hospital Geral de Taubaté.
Na época, o assunto ficou conhecido nacionalmente e a imprensa o tratou como caso Kalume, em referência ao sobrenome do denunciante. O escândalo culminou com a abertura de inquérito policial em 1987 e até virou alvo em 2003 da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apurava a atuação de organizações criminosas atuantes no tráfico de órgãos no Brasil. Um dos depoimentos mais marcantes em Brasília foi o da enfermeira Rita Maria Pereira, que revelou ter presenciado os médicos retirando os rins de um paciente que ainda se debatia na maca: “[...] O tempo todo o paciente gemia de dor, sentiu quase toda a cirurgia e ao final estava quase consciente tentando sentar-se na maca [...]. Ele [o médico Pedro Henrique Torrecillas] colocou os dois rins ali dentro, muito bravo e saiu com os dois rins, mas o paciente ainda continuava vivo. Um residente assustado com a situação perguntou o que fazer com o paciente que não parava de se debater após a retirada do rim. Na sequência, Pedro Henrique voltou a sala e falou, ‘é tão simples’, e afundou o bisturi no coração do paciente” (trecho extraído do relatório da CPI, sobre o depoimento da enfermeira).
MAIS DE 10 ANOS DE DENÚNCIAS DE PAULO PAVESI
SOBRE A MORTE DE SEU FILHO PAULINHO
E TRÁFICO DE ÓRGÃOS NO BRASIL
Paulo Pavesi
Paulo Pavesi, cidadão italiano, é Gerente de Sistemas e há 10 anos luta contra a Máfia do Tráfico de Órgãos de Minas Gerais. Atualmente, encontra-se sob proteção internacional do Governo Italiano, através de asilo humanitário concedido em 17 de Setembro de 2008.
Mais de 23 anos depois das denúncias que levaram ao indiciamento de quatro médicos de Taubaté acusados de integrar um esquema de tráfico de órgãos, familiares das vítimas ainda aguardam uma resposta da Justiça sobre o caso.
O processo, onde os réus Mariano Fiore Junior, Pedro Henrique Masjuan Torrecilas, Rui Noronha Sacramento e Aurélio de Carvalho Monteiro respondem por quatro homicídios, está no Fórum Criminal e só deve ser julgado no primeiro semestre de 2011.
Os crimes teriam sido cometidos em 1986. Na época, o ex-diretor da Faculdade de Medicina de Taubaté, Roosevelt de Sá Kalume, afirmou que os médicos aceleravam a morte dos pacientes que ainda não apresentavam morte cerebral para retirar seus órgãos, que seriam traficados para transplantes. Tudo aconteceria no Hospital Santa Isabel de Clinicas, onde hoje funciona o Hospital Regional.
Para o porteiro Ivã Gobbo,65 anos, irmão da vítima Irani Gobbo, a ausência de uma resposta da Justiça neste caso aumenta a dor. Na época, Irani sofreu um aneurisma cerebral e foi levado para o hospital, onde teria sido vítima dos médicos.
Depois de todas as denúncias monstruosas, para as famílias restava apenas que a Justiça fosse feita, mas lá se vão mais de 20 anos sem resposta alguma.
O inquérito instaurado para apurar o caso levou 11 anos para ser concluído.
De acordo com o delegado Roberto Martins de Barros, que comandou o caso, apesar das dificuldades encontradas para a elaboração de provas, entre elas a resistência do Conselho de Medicina em auxiliar nas investigações, o crime ficou evidente. “Os laudos da perícia foram conclusivos, apontando que não existia a morte cerebral das vítimas. Assim, os órgãos foram retirados com os pacientes ainda vivos.”
Devido à gravidade das denúncias, que ganharam destaque nacional e internacional, o suposto caso de tráfico de órgãos de Taubaté em 2003 foi alvo de investigação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). Na época, os deputados convocaram todos os envolvidos a prestar depoimentos, entre eles duas enfermeiras que teriam presenciado a retirada ilegal dos órgãos.
Em um depoimento, a enfermeira Rita Maria Pereira revelou ter presenciado os médicos retirando os rins de um paciente que ainda se debatia na maca: “[...] O tempo todo o paciente gemia de dor, sentiu quase toda a cirurgia e ao final estava quase consciente tentando sentar-se na maca...um residente assustado com a situação perguntou o que fazer com o paciente que não parava de se debater após a retirada do rim. Na sequência, Pedro Henrique voltou a sala e falou, ‘é tão simples’, e afundou o bisturi no coração do paciente”, (trecho extraído do relatório da CPI, sobre o depoimento da enfermeira).
De acordo com o promotor responsável pelo caso, Luiz Marcelo Negrini, apesar dos crimes terem sido cometidos há mais de 20 anos e a prescrição para casos de homicídio ser de 20 anos, não há risco neste caso, já que existem andamentos no processo que provocam o rompimento da prescrição, como a pronúncia do juiz. Ainda segundo o promotor, o Ministério Pública acompanha o caso e também não tem dúvidas de que os homicídios tenham sido cometidos.
De acordo com o juiz responsável pelo caso, Marco Antônio Montemor, o júri popular para finalizar este processo deve ocorrer no primeiro semestre de 2011. O juiz afirmou que não existem mais andamentos nem recursos que impeçam o agendamento do júri, mas a data ainda não foi marcada e não vai ocorrer este ano por se tratar de um processo antigo e muito extenso. “São 54 volumes de processo, cada um com 200 páginas. Tudo está sendo analisado e assim que for concluído o estudo do caso a data será agendada.”
Ainda de acordo com Montemor, o júri popular deve levar vários dias.
Na ocasião, deverão ser interrogados os quatro réus, as testemunhas de acusação (somente na denúncia do Ministério Público somam 18 pessoas) e as testemunhas de defesa (cada um dos réus pode arrolar até cinco testemunhas). Em seguida, devem ter início os debates entre defesa e promotoria; só então o Conselho de Sentença irá se reunir.
“Não é uma acusação comum ao dia a dia da Justiça. Mesmo sendo um processo muito antigo, ainda hoje denúncias como esta são incomuns. São muitos volumes, com provas tanto de acusação quanto de defesa bastante extensas e bem sustentadas e tudo isso será analisado”, disse Montemor
Algumas informações interessantes que poucos sabem. O neurologista Antonio Aurelio de Carvalho Monteiro, um dos acusados, foi preso em 2001 enquanto ocupava o posto de Diretor do IML de Franco da Rocha por trafico de cadaveres e de orgaos humanos. Leia aqui na FolhaOnLine. Na época, mesmo respondendo ao processo referido na matéria acima, o governador de Sao Paulo Geraldo Alckmin nao exitou em nomea-lo como Diretor do IML. Geraldo Alckmin também é medico. Mais uma vez, podemos ver as maos do PSDB envolvida com trafico de orgaos. Coincidência?
Segundo o Ministério Público, o crime está comprovado. Segundo especialistas nomeados pelo CFM também. Mas, o próprio CFM é contra o processo e defende os acusados. Será que as autoridades brasileiras terão coragem de condenar os acusados, mesmo sabendo que eles podem revelar quem está por trás destes crimes? Alguém pedirá explicaçoes para a ABTO, ou continuarão a tratá-los como os "bons salvadores de vidas"?
PAULINHO - ASSASSINADO
PELA MÁFIA DE TRÁFICO DE ÓRGÃOS
O caso Paulinho pode ter um desfecho bem diferente. Começa pela forma como abordaram os crimes. O Ministério Público Federal separou as vítimas em diversos processos, diferente do caso de Taubaté que foram reunidos em um só. Além disso, o Ministério Público pulverizou os acusados, ou seja, do mesmo grupo, cada um responde apenas por um homicídio e não por todos os cometidos. O grupo deveria responder por todos os homicídios cometidos. Outro fator importante é que os familiares das vítimas do caso de Poços de Caldas sequer sabem que seus entes queridos constam como vítimas de homicídio nos processos que estão sendo manipulados por Mosconi e que foram até enviados para Pouso Alegre para facilitar o controle.
Poços de Caldas, Minas Gerais
Mas, a luta de Paulo Pavesi não tem sido em vão. Não fosse ter conseguido a instalação da CPI referida na reportagem, o caso de Taubaté acabaria como muitos outros, sem um julgamento, sem uma resposta e sem culpados e com muita gente enriquecida com venda dos órgãos. O caso voltou à tona com a CPI, com a fundamental ajuda dos deputados federais Neucimar Fraga.
Tráfico de Órgãos - Caso Paulo Pavesi. Depois desta reportagem, a Rede Globo foi proibida de falar no assunto. Nem mesmo a CPI foi noticiada pela emissora.
Os depoimentos colhidos durante a CPI encorajaram enfermeiras a sairem do escuro e falaram abertamente o que presenciaram. O Deputado Geraldo Tadeu (PPS-MG) que era prefeito de Poços de Caldas na época em que assassinaram meu filho, tentou desqualificar a CPI e também os depoimentos das enfermeiras como consta nas notas taquigráficas, mas ao que tudo indica, não obteve sucesso. O processo segue. Geraldo Tadeu é parceiro politico de Mosconi e atuam juntos fervorosamente na região do sul de Minas.
A história de Taubaté teve um personagem muito importante: Dr. Roosevelt de Sa Kalume, que denunciou as práticas assassinas. Kalume escreveu um livro em 1993 narrando detalhes do ocorrido. Mas o livro foi recolhido e a editora fechada. Atualmente, pode ser encontrado em algumas lojas virtuais.
"Vale a pena ler e conhecer o envolvimento de autoridades
numa história verídica e macabra, tal qual a história do meu filho."