Princípio do Consentimento Informado
Professora Sílvia Mota
Noções gerais: definição, princípios e obrigatoriedade
O princípio do consentimento informado indica que, em qualquer tratamento, deve-se observar a aquiescência livre do paciente quanto aos métodos ou intervenções aconselháveis ao seu caso. É, em sua essência: “[...] expressão de auto determinação (direitos) do ser humano, derivado do respeito ao referencial bioético da autonomia.”
Segundo Luis Carlos Silva de Sousa: “Uma concepção adequada de consentimento deve respeitar o valor objetivo da pessoa humana, seguindo um princípio de autonomia e liberdade que transcenda o contrato intersubjetivo médico-paciente.” Sendo assim, respeita- se, com o Termo de Consentimento Informado, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, previsto no art. 1º, inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, assim como os princípios bioéticos. Na prudência para decidir e atuar com a verdade deve estar implícito o princípio da não-maleficência, assim como não mentir, respeitando sempre os direitos do enfermo, seus valores culturais e os de sua família. A Bioética não pretende dar os elementos para uma adequada proteção legal, mas afiançar a autonomia e o respeito à dignidade da pessoa humana, livre de qualquer tipo de manipulação.
Alguns profissionais da saúde interpretam a obtenção do consentimento informado como um estorvo legal e em muitos casos possuem documentos prontos que o paciente somente deve firmar, sem nele estarem fixadas especificidades do caso em concreto. Consideram-no, portanto, uma perda de tempo. Em contrapartida, preleciona Victor Vargas que do ponto de vista da relação médico-paciente, o consentimento informado representa “[...] um direito inalienável para o paciente e um dever inescusável para o médico.”
O paciente é o árbitro final quanto a se correrá os riscos envolvidos no tratamento ou na operação recomendados pelo médico, ou se arriscará a viver sem isso. Este é um direito natural do indivíduo reconhecido por lei, salientando, por sua vez, o Papa João Paulo II, que obrigar alguém a violar sua consciência “[...] é o golpe mais doloroso infligido à dignidade humana. Em certo sentido, é pior do que infligir a morte física, ou matar.” Inegável, portanto, a necessidade da sua obtenção.
Breves antecedentes
Data de 1767 a primeira citação sobre consentimento informado, sem a utilização desta terminologia, que só foi utilizada em 1957. Na Inglaterra, o paciente Sr. Slater, procurou o médico Dr. Baker, que atuava junto com o Dr. Stapleton, para dar continuidade ao tratamento de uma fratura óssea em sua perna. Os dois médicos, sem consultar o paciente, ao retirarem a bandagem, desuniram o calo ósseo, propositadamente, com o objetivo de utilizarem um aparelho, de uso não convencional, para provocar tração durante o processo de consolidação. Dessa ação surgiu novo prejuízo à saúde do paciente, que foi à Justiça sob a alegação de que os médicos, por ignorância e imperícia, provocaram-lhe nova fratura, causando danos desnecessários, além do que não lhe prestaram os devidos esclarecimentos sobre o procedimento a ser realizado e nem lhe pediram consentimento para a intervenção. Com o objetivo de esclarecer detalhes pertinentes ao caso, utilizaram-se laudos de dois médicos reconhecidamente competentes na área em litígio. Os peritos foram unânimes em afirmar que o equipamento utilizado não era de uso freqüente e que somente seria necessário refraturar uma lesão óssea no caso de estar sendo muito mal consolidada. Afirmaram, ainda, que somente realizariam nova fratura em um paciente que houvesse consentido com a intervenção. O paciente alegou, inclusive, que teria protestado quando à realização do procedimento, solicitando que o mesmo não fosse levado adiante. Em razão do exposto, a Corte condenou os médicos por quebra de contrato na relação ao paciente. Vale lembrar que, à época, era prática dos cirurgiões informarem ao paciente os procedimentos a serem realizados, devido à necessidade de sua colaboração, pois ainda não havia anestesia.
Elementos essenciais
Ao enfermo assiste o direito de estar informado acerca de seu padecimento, sobre a proposta de tratamento e terapias alternativas, riscos e probabilidade de resultados adversos, para poder tomar uma decisão afirmativa. Portanto, três elementos essenciais devem ser levados em conta no consentimento: informação, consentimento livre e capacidade para entender e decidir.
Todo paciente tem o direito de receber, por parte do profissional escolhido para assisti-lo, informação sincera e detalhada sobre sua saúde e seu consentimento informado deve ser obtido livre de toda coerção. A esse respeito, no Brasil, consta do art. 15 do Código Civil de 2002 que ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou intervenção cirúrgica. Finalmente, o paciente deve estar em condições mentais apropriados e demonstrar capacidade suficiente para aceitar ou não o cumprimento, procedimento ou intervenção. A informação se relaciona diretamente com a ética médica, sendo obrigação dos operadores na área da saúde e de todos os profissionais em geral.
A informação é um direito fundamental da pessoa humana, inscrita na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, na Declaração de Genebra, entre outros. E, por ser assim, o direito à informação tem base constitucional, porque se respalda nos princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana, no respeito à liberdade de tomada de decisão e na autonomia da pessoa capaz.
Requisitos mínimos
O consentimento informado é obrigatório, sendo o formulário escrito convenientemente para deslindar responsabilidade de insucessos previsíveis, devendo aplicar- se qualquer seja a magnitude da intervenção. A informação proporcionada ao paciente quanto à sua doença deve ser explicada de forma elementar e compreensível, não sendo permitido o uso de palavras abreviadas, nem de terminologia científica. O texto deve coadunar-se ao nível intelectual da população a qual se dirige, não devendo, no Brasil, superar o nível de educação primária.
São requisitos mínimos a serem considerados num documento de consentimento informado:
.Nome e sobrenome do paciente e do médicoinformante.
.Explicação da natureza da enfermidade e sua evoluçãonatural.
.Nome do procedimento a realizar e especificações do que consiste e como será levado atermo.
.Explicação dos benefícios que razoavelmente se podem esperam da intervenção e conseqüência dadenegação.
.Informação sobre os riscos da intervenção, prováveis complicações, mortalidade e seqüelas.
.Alternativas de tratamento comparadas com o tratamentoproposto.
.Explicação sobre o tipo de medicação exigível para a intervenção e seusriscos.
.Autorização para obter fotografias, vídeos ou registros gráficos, antes, durante e pós-intervenção, para difundir os resultados ou iconografia em Revistas Médicas e/ou nos âmbitoscientíficos.
.Possibilidade de revogação do consentimento em qualquer momento antes da intervenção.
.Satisfação do paciente pela informação recebida e afastamento de todas as suas dúvidas.
.Assinatura e firma reconhecida do médico, paciente e testemunhas, sehouverem.
Textos disponíveis na Internet:
Diversos modelos de Termos de Consentimento Informado:
Diretrizes e resoluções éticas.Conselho Nacional de Saúde: Resolução nº 196/96, n. IV
Leis jurídicas nacionais Código Civil/2002:
.O art. 15 do Código Civil/2002 preceitua: “Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.”
Código Penal/1940:
.Constrangimento ilegal: art. 146 CP.Aumento de pena: Art. 146, § 1º, CP.Exercido para impedir suicídio: Art. 146, § 3º, II, CP.Intervenção médica sem consentimento do paciente: Art. 146, § 3º, I, CP
Art. 146. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.
§ 1º As penas aplicam-se cumulativamente e em dobro, quando, para a execução do crime, se reúnem mais de três pessoas, ou há emprego de armas.
§ 2º Além das penas cominadas, aplicam-se as correspondentes à violência.
§ 3º Não se compreendem na disposição deste artigo:
a) a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo devida;
b) a coação exercida para impedirsuicídio.
Referências
HOSSNE, William Saad. Consentimento: livre e esclarecido. Cadernos de Ética em Pesquisa, Brasília, DF, ano V, n. 10, p. 3, jul. 2002.
SOUSA, Luis Carlos Silva de. A questão do consentimento. Cadernos de Ética em Pesquisa, Brasília, DF, ano V, n. 10, p. 29, jul. 2002.
VARGAS, Victor. Consentimiento informado y relación médico paciente. Revista Hospital Clínico Universidad de Chile, Santiago, v. 13, n. 1, p. 4, 2002.
POPE denounces Polish crackdown. New York Times, New York, 11 jan. 1982, p. A9.
GOLDIM, José Roberto. Primeira sentença judicial sobre a necessidade do uso de consentimento. Núcleo Interinstitucional de Bioética da Universidade do Rio Grande do Sul/Hospital das Clínicas de Porto Alegre, Porto Alegre. Disponível em: <http://www.ufrgs.br/bioetica/conslate.htm>. Acesso em: 15 dez. 2007.
Enviado por Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz em 16/01/2014
Alterado em 06/10/2016