VISÃO HISTÓRICA DAS LENTES DE CONTATOSílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz- Reeditado em 24 de fevereiro de 2012 –
Obras de referência
Saly M. Bugmann Moreira e Hamilton Moreira, no primeiro capítulo da sua obra “Lentes de contato”, escrito com a colaboração de Carlos Augusto Moreira, fazem uma retrospectiva no tempo e no espaço, para desvendar as origens das lentes de contato e é principalmente nesses escritos que este trabalho busca fundamentos.
Origem
Por volta de 1500, Leonardo da Vinci realizou experimentos com o objetivo de pesquisar a formação das imagens oculares. Seus desenhos esquemáticos para modificar a visão eram complexos. Um deles consistia em um recipiente grande de vidro em forma de cúpula que cheio de água era colocado em frente da face e, portanto, também do olho. Dessa forma, realizou um olho esquemático, com um diafragma que representava a íris e uma lente artificial para o papel de cristalino.
Dos séculos XVII ao século XIX
Em 1636, René Descartes construiu uma lente deveras rudimentar e distinta das atuais, conquanto reconhecesse sua função óptica utilizada para modificar a potência dióptrica da córnea. Trata-se de um tubo de vidro repleno de água, cuja superfície de uma das extremidades apresenta curvatura semelhante à da córnea, enquanto a outra extremidade, oca, é inserida diretamente sobre o olho. Em virtude de ser este dispositivo colocado diretamente sobre o olho, pode-se considerar Descartes como o verdadeiro descobridor da lente de contato.
Em 1801, o inglês Thomas Young estudou o processo de acomodação, ao utilizar um tubo de 25mm de comprimento com uma extremidade fechada por uma lente biconvexa, preenchido de água e colocado em contato com o olho, o que neutraliza o efeito refrativo da córnea. Provou, assim, que a córnea não faz parte do processo acomodadiço. Esse dispositivo, apesar de ser muito diferente das lentes de contato atuais, conseguiu modificar o valor dióptrico da córnea.
Em 1817, Sir Frederick William Herschel (apud MOREIRA, MOREIRA, 1998, p. 2), astrônomo e físico inglês, escreveu em “On Light,”: “Em certos casos de conformação viciosa da córnea, seria interessante examinar se uma gelatina animal transparente posta em contato com esta túnica e contida por uma cápsula de cristal não poderia proporcionar uma visão distinta.” Os resultados obtidos fracassaram e a pesquisa foi abandonada. Em sua opinião, a adaptação de lente sobre a superfície corneana anterior constitui o melhor método para neutralizar uma ametropia.
Em 1877, F. C. Müller, de Wiesbaden, produziu lente de contato de vidro sem nenhum efeito óptico. Prescrita pelo Dr. Saemisch, foi utilizada como escudo de proteção em um paciente com as pálpebras retiradas numa cirurgia. O paciente usava essa lente por vinte anos.
No fim do século XIX, desenvolveram-se os oftalmômetros de Helmholtz (1855) e de Javal (1881), o que despertou grande interesse no estudo da geometria corneana. No ano de 1888, simultânea e independentemente, Adolf EugèneFick, de Zurique, EugèneKalt, de Pris e A. Müller, de Kiel inventaram a lente de contato.
Em 1888, Adolf EugèneFick, descreveu inicialmente uma lente de contato de vidro (BISWELL, 1998, p. 142). O cientista introduziu o termo óculos de contato. Utilizou aquelas lentes de contato no tratamento do ceratocone e aconselhou a colocar entre a lente e os olhos uma solução diluída de glicose com o mesmo índice de refração da córnea.
Na mesma época, August Müller, ainda estudante da Universidade de Kiel, instruiu a um óptico de Berlim chamado Himmler, que fabricasse uma lente de contato destinada a corrigir sua própria miopia, aproximadamente 14 D. A lente continha o mesmo diâmetro da córnea. Posteriormente, após uma série de tentames, realizou sua tese de doutoramento (1889). Foi o primeiro estudioso a empregar a palavra lente corneana e observar que a lágrima exerce função metabólica.
Em 1888, EugèneKalt apresentou estudo sobre lente de contato na Academia de Medicina de Paris, sendo considerado pelos autores franceses o primeiro a empregar o sistema em ceratocone, o que é difícil precisar, pois os trabalhos foram publicados simultaneamente.
Século XX
Em 1912, ocorreram novos avanços com a confecção de lentes corneanas de vidro. Em 1930, Dr. Heine da Universidade de Kiel publicou o resultado das suas investigações sobre o tema “A compensação de todos os defeitos de refração do olho por meio de vicros de contato trabalhados (cápsulas que se levam debaixo das pálpebras)”. Nessas, utilizou-se o soro fisiológico como lente líquida, pelo fato de possuir um índice de refração de 1.336, que é muito próximo ao da córnea (1.376). Nesse mesmo ano, Czapody conseguiu moldes do segmento anterior do olho com um colóide denominado dentalcol.
Em 1933, o húngaro J. Dallos publicou um procedimento para obter moldes da superfície anterior da córnea do paciente para fabricação de lente de contato apropriada para cada caso. O método de Dallos foi aperfeiçoado por Obrig, Stevens e Defruse.
Não obstante, desde 1888 até 1948, as lentes de contato mais empregadas são as esclerais, fabricadas de vidro soprado, depois desbastadas e polidas. As casas mais destacadas nestes processos foram a de Müller de Wiesbaden e Zeiss de Jena.
Com o advento do plástico, novos horizontes se abriram à contatologia. Em 1936, o norte-americano W. Fleinbloom utilizou, pela primeira vez, o plástico para produzir uma lente de contato escleral em combinação com vidro: a porção corneana da lente era de vidro e a escleral de plástico.
Em 1936, iniciou-se o uso do metil metacrilato como material apropriado para fabricação de próteses oculares e lentes de contato e restou comprovado que esse material era inerte aos tecidos oculares, leve, transparente, fácil de ser trabalhado e não se quebrava com facilidade.
Em 1938, T. Obrig e Müller utilizaram pela primeira vez o polimetil metacrilato (PMMA), material até hoje usado, para fabricação de lente de contato escleral.
Em 1947, iniciou-se nova era com a introdução das lentes de contato corneanas de PMMA, por Kevin Tuohy. Em sua patente, concedida em 1948, descreveu a lente como tendo um “[...] tamanho menor que o limbo mas maior que a máxima pupilar e um raio de curvatura levemente mais plana que a córnea, onde afirma que a lente pode contatar a córnea perto do centro da lente.”
Para os autores franceses, as principais lentes corneanas foram criadas em 1947, por Jean Cabarrouy, médico francês radicado na Argentina, que nesta época também as desenhou.
Em 1952, os trabalhos independentes de Dickinson, Neill e Soehnges trouxeram maior aperfeiçoamento à lente corneana. Diminui-se o seu diâmetro para 9,5 mm e a denominaram de microlente. A partir de então, produziram-se vários desenhos de lentes de contato com diferentes diâmetros, curvas e bordas, com êxitos progressivamente melhores.
Em 1950, Wichterle e Lim introduziram o polímero hidrogel para vários usos médicos e, em 1960, publicaram Hidrofilicsgels for biological use. Em 1963, Otto Wichterle, então diretor do Instituto de Química Macromolecular de Praga, apresentou as primeiras lentes hidrofílicas, do polímero 2hidroxi-etil-metacrilato conhecido como PHEMA, que é um hidrogel. A lente hidrofílica, pelo seu conforto, aumentou em muito a aceitação do uso da lente de contato pelo grande público.
Em 1978, iniciou-se o uso de materiais ópticos permeáveis ao gás para a fabricação de lentes rígidas. As primeiras lentes lançadas foram as de acetato butirato de celulose (CAB) e as lentes rígidas siliconadas (copolímero de metil metacrilato e siloxane).
Em 1971, John de Carle lançou as lentes hidrofílicas Permalens para uso prolongado, com aproximadamente 78% de hidratação a 20 graus centígrados e 72% (água/peso) a 38 graus centígrados, que se caracterizaram por sua elevada permeabilidade a diversos metabólitos, especialmente ao oxigênio.
Em 1979, nos Estados Unidos da América aprovaram-se pelo F.D.A. (Agência para Controle de Drogas e Alimentos) as primeiras lentes hidrofílicas para uso prolongado.
Em 1985, surgiram as lentes rígidas gás-permeáveis de alto valor DK com indicação para uso prolongado.
Chega-se, assim, ao estágio atual, onde as lentes de contato são relativamente bem toleradas e com mínima intervenção sobre a nutrição e a higidez da córnea. Contudo, as pesquisas e a evolução tecnológica continuam e com elas novos polímeros e combinações surgirão para que se chegue a uma situação cada vez melhor, pois que a perfeição absoluta é inatingível.
REFERÊNCIAS
BISWELL, Roderick. Córnea. In: VAUGHAN, Daniel, ASBURY, Taylor, RIORDAN-EVA, Paul (Ed.). Oftalmologia geral. 4. ed. Tradução por: Renato L. Gonzaga, Ricardo Mörshbächer. São Paulo: Atheneu, 1998, p. 142.
MOREIRA, Saly M. Bugmann, MOREIRA, Hamilton. Lentes de contato. 2. ed. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 1998, p. 2-4. Capítulo 1: História das lentes de contato, escrito com a colaboração do Prof. Carlos Augusto Moreira.
Enviado por Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz em 23/04/2013
Alterado em 21/03/2017