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ARISTÓTELES
- Sílvia Mota -


Este trabalho tem por principal fonte de pesquisa o livro de Diogenes Laertius, Vidas, opiniões e ditos de filósofos famosos, obra escrita no século III da Era Cristã, portanto, seis ou sete séculos após a época em que Aristóteles viveu. Em razão do extenso lapso temporal, a obra não se fundamenta em dados de fonte primária, o que coloca em dúvidas muitas informações concernentes à sua biografia. A medida que obtivermos outras fontes de pesquisa este trabalho será atualizado.

Nascimento e infância

Do que se tem notícia, Aristóteles nasceu na aldeia Estagira (em grego antigo 'Στάγειρος', "Stágeiros", depois Στάγειρα, "Stágeira"), situada ao norte da Macedônia. Em decorrência, é muitas vezes chamado de “O Estagirita”.

As famílias dos pais de Aristóteles eram de origem Jônica (uma região que fica na parte oeste da atual Turquia). A antiga Jônia foi pátria de diversos filósofos admiráveis, anteriores a Aristóteles, como Tales e Anaximandro. Nicômaco, o pai de Aristóteles, pertencia a uma família de médicos (o clã dos Asclepíades) que se consideravam descendentes do lendário Asclépio. Nicômaco era amigo e médico pessoal do rei da Macedônia, Amintas III, pai de Filipe II e avô de Alexandre, o conquistador. Por tal motivo, pelos jardins da corte, Aristóteles passou a maior parte de sua precoce infância. Muitos autores pensam que a influência paterna pode ter sido determinante no interesse de Aristóteles pelos problemas biológicos, posteriormente. A mãe de Aristóteles, chamada Phaestis, era de uma família rica da cidade de Chalcis, na ilha de Euboea, povoada pelos jônios. Há informações de que Aristóteles teve uma irmã e um irmão, chamados Arimneste e Arimnestos.

Antes de completar dez anos, Aristóteles perdeu os pais e passou à proteção do tio, Proxenos de Atarneos. Mais tarde, como em agradecimento, Aristóteles adotou e criou seu primo Nicanor, filho de Proxenos. Alguns pesquisadores afirmam que Proxenos ensinou a Aristóteles retórica e poesia, o que lhe renderia diversos elogios, quando viveu em Atenas.

Adolescência em Atenas

Aos dezessete anos, enviado para a Academia de Platão, em Atenas, mergulhou de todo o coração nos ensinamentos de Platão, concernentes à verdade e à bondade. Logo se tornou o melhor aluno de Platão, recebendo o apelido de "inteligência da escola".

Casamento e descobertas do mundo natural

Vinte anos após a chegada de Aristóteles, Platão morreu e Aristóteles deixou a Academia para viajar. Dessas viagens, que o levaram através do império grego e da Ásia Menor durante doze anos, resultou sua pesquisa em história natural e biologia.

Em 342 aC, Filipe II convidou Aristóteles para retornar ao tribunal macedônio e ensinar seu filho, Alexandre, que mais tarde ficou conhecido na História como Alexandre, o Grande.

Após a morte de Filipe e ascensão de Alexandre ao trono, Aristóteles deixou o tribunal para uma breve visita à sua cidade natal. Logo a seguir voltou a Atenas para retomar seus estudos científicos. Em 335 aC fundou uma universidade à qual se chamou Lyceum.

Aristóteles renunciou a algumas das teorias de Platão e começou seu próprio e brilhante estilo de ensino na escola recém-criada. Pela manhã, passeava pelos jardins do Lyceum, a discutir problemas e teorias com seus mais destacados alunos. Porque caminhava enquanto propagava seu conhecimento, os atenienses apelidaram sua escola de Escola Peripatética – termo grego que significa "A caminhar sobre". Enquanto diretor, os alunos do Lyceum realizaram pesquisas em quase todos os campos de conhecimento existentes até então. Dissecaram animais e estudaram os hábitos de insetos, auxiliando Aristóteles no processo de compilação dos dados para seu sistema de classificação das espécies. A escola tornou-se o bloco básico de construção para grande biblioteca e museu na área.

Aos 37 anos de idade, Aristóteles apaixonou-se pela jovem Pythias, que ostentava a metade da sua idade, e com quem logo se casou. Pythias era a filha adotiva de Hermeias, o Eunuco – rico tirano das cidades de Assos e Atarneos.

Aristóteles e Pythias se conheceram e casaram na cidade fortificada de Assos, numa região que pertence atualmente à Turquia. Na época, o noroeste da Ásia Menor se chamava Mysia, e a região onde estava Assos era chamada Troad. As ruínas de Tróia ficavam 50 km ao norte. Em mapas atuais, a cidade tem o nome de Behramkale.

Aristóteles pertencia a uma família rica e já era reconhecido como um importante filósofo. Não existe um relato histórico do casamento, mas Sappho (1992, fragmento 51 Bergk) expõe rico pensamento: “E então o vaso de ambrosia foi misturado e Hermes tomou a colher para derramar a porção dos deuses; e depois todos tomaram suas taças, fizeram libações e desejaram felicidade ao noivo.”

Sobre o casamento, o célebre filósofo escreveu em sua Política: “As mulheres devem se casar quando têm cerca de 18 anos de idade, e os homens com 37; então eles estão no auge de sua vida, e o declínio dos poderes de ambos coincidirão. Além disso, os filhos, se eles nascerem logo, como se pode esperar, os sucederão no início de seu ápice, quando os pais já estarão no declínio da vida, e terão quase alcançado seu limite de setenta anos.” (ARISTÓTELES, Politica, livro 7, cap. 16, 1335a 28-34).

A partir da citação não seria exagero da pesquisadora concluir que o casamento de Aristóteles foi feliz, pois o aconselha a todos.

Para além das nossas elucubrações o filósofo Aristippos, em seu livro sobre “Os prazeres dos antigos”, afirmou que Aristóteles “[...] ficou tão feliz que lhe ofereceu sacrifícios, como os atenienses faziam para Deméter em Eleusis.” Não era normal, à época, reverenciar uma mulher como se fosse deusa. A atitude de Aristóteles provocou escândalo e foi, depois, utilizada como evidência de que não respeitava a antiga religião. Mendes (1908, p. 5) também referencia que a paixão chegou a levar Aristóteles: “[...] aquele que Dante proclamou o mestre dos que sabem, a ver-se exposto a ser condenado à morte acuzado, ha mais de 22 séculos (384-322 a.C.) por ter tributado à sua espoza as honras que érão devidas a Céres; e no seu testamento ele requereu que os réstos déssa espoza fôssem reünidos no seu sepulcro.”

Do templo de Athena, no topo da colina de Assos, era possível ver a ilha de Lesbos, a apenas 10 km de distância do continente, separada deste pelo golfo de Edremit. Foi nesta ilha que Aristóteles e Pythias passaram a viver. Era um local famoso na época por seu desenvolvimento cultural, a terra onde nascera e vivera Sappho, a grande poetisa grega, anteriormente referenciada.

Durante o curto período em que viveu na ilha de Lesbos, conta a lenda que Aristóteles convivia com pescadores e criadores de abelhas, com caçadores, criadores de animais e homens do campo, e ele próprio se entregava ao prazer de olhar para o mundo à sua volta, observando pássaros, cavalos, golfinhos, insetos e centenas de outros animais. Com uma curiosidade insaciável, anotava fatos e mais fatos, dissecava e descrevia coelhos, gafanhotos e ouriços do mar, experimentava afogar uma tartaruga na água, ressuscitava moscas colocando-as perto de cinzas quentes, e refletia sobre tudo o que via (MARTINS, p. 3).

Morte

Por volta do ano 323 aC, o imperador Alexandre morreu, forçando Aristóteles a deixar Atenas devido ao sentimento anti-macedônio e as acusações de impiedade. Aristóteles foi para Chalcis, a terra natal de sua mãe, onde morreu um ano depois.

Contribuição para o mundo do conhecimento

Aristóteles contribuiu de forma relevante para o campo da biologia, especialmente através dos seus primeiros trabalhos na classificação das espécies, quando estabeleceu os princípios básicos da divisão e subdivisão de plantas e animais. Naquela época, apenas cerca de mil espécies eram conhecidas e Aristóteles conseguiu agrupá-los em categorias simples de animais com sangue vermelho (com coluna vertebral) e animais sem sangue vermelho (sem coluna vertebral). As plantas foram divididas em diferentes categorias que lidavam mais com tamanho e aparência.

O sistema de classificação de Aristóteles permaneceu intacto por quase 2000 anos, até que em 1500 os cientistas reconheceram que o crescimento do conhecimento necessitava de expansão. A mudança ocorreu lentamente, com grande debate, e revelou a complexidade do processo. No final dos anos 1700, o sistema de classificação aristotélica foi finalmente substituído por um muito mais abrangente e sistemático desenvolvido pelo naturalista sueco, Carl Linnaeus.

As inquirições de Aristóteles eram novas, diferentes de tudo o que se discutia na Academia platônica. Antes do pensador, outros como Demócrito e Empédocles, dedicaram-se ao estudo dos seres vivos, mas seguramente ninguém, antes de Aristóteles, se dedicou sistematicamente a observar e a desenvolver uma teoria sobre a vida, da forma como fez o Estagirita. Seu invulgar e monumental trabalho arrancou elogios de Cuvier (v. 1, p. 130-132), um dos maiores naturalistas do século XIX:

“Sozinho, sem antecedentes, sem nada que pudesse tomar de emprestado aos séculos que o haviam precedido, já que eles nada haviam produzido de sólido, o discípulo de Platão descobriu mais verdades e executou mais trabalhos científicos em sua vida de 62 anos do que foi possível fazer nos vinte séculos seguintes, mesmo dispondo da ajuda de suas idéias, com a vantagem da expansão do gênero humano sobre a superfície habitável do globo, com a imprensa, a gravura, a bússola, a pólvora dos canhões, o álcool e a ajuda de tantos homens de gênio que apenas conseguiram arrastar-se sobre suas pegadas, no vasto campo da ciência.

Depois de Sócrates, Aristóteles é o primeiro a ensinar e a seguir, em uma escala muito mais avançada, o método de observação, colocando assim as ciências sobre seu verdadeiro terreno. [...] Aristóteles conseguiu se dedicar aos estudos mais detalhados e mais profundos. Depois ele reuniu as diversas partes de seu trabalho e com elas formou o maior corpo de doutrinas, o mais vasto sistema que jamais foi produzido. É um resultado único da onipotência da paciência que recolhe os detalhes e do gênio generalizador que extrai de sua comparação e semelhança os métodos e teorias mais elevados (CUVIER, Histoire des sciences naturelles, v. 1, p. 130-132).

Tudo assombra, tudo é prodigioso, tudo é extraordinário em Aristóteles. Viveu nada mais do que 62 anos, mas concretizou milhares de observações de extremada minudência e cuja rigorosidade não foi contradita pela crítica posterior mais austera.

Salienta-se que a classificação das espécies, não foi acidental. Graças à sua meticulosa observação, acreditava Aristóteles, a Natureza nunca criara nada sem uma razão. Particularmente fascinado por criaturas do mar, muitas vezes, dissecava-os e estudava os seus habitats naturais. Esta abordagem para a anatomia o levou a procurar correlações entre estrutura e função e à crença de que cada parte biológica tem seus próprios usos especiais.

Eis palavras apaixonadas de Aristóteles, sobre o próprio trabalho:

“Das coisas constituídas pela natureza, algumas [as celestes] não tiveram início, são eternas, indestrutíveis, enquanto outras estão sujeitas ao nascimento e à morte. As primeiras são excelentes além de toda comparação e divinas, mas são menos acessíveis ao conhecimento. As sensações nos fornecem poucas evidências que possam lançar luz sobre elas e sobre os problemas que gostaríamos de resolver sobre as mesmas. No entanto, com relação às plantas e animais perecíveis, temos informação abundante, já que vivemos no meio deles e podem ser coletados muitos dados sobre seus muitos tipos, desde que desejemos ter esse trabalho.

[...]

Já tendo tratado do mundo celeste, tanto quanto nossas conjeturas permitiam, procederemos ao tratamento dos animais, sem omitir nenhum membro desse reino, por mais ignóbil que seja, dentro daquilo que nossa habilidade nos permite. Pois se alguns não possuem beleza que encante os sentidos, mesmo esses, ao revelarem à percepção intelectual o espírito artístico que os estrutura, dão imenso prazer a todos aqueles que possuem tendência filosófica e que conseguem encontrar suas causas. [...] Portanto, não devemos fugir com aversão infantil do exame dos animais mais humildes. Cada reino da natureza é maravilhoso. Conta-se que quando certos estrangeiros foram visitar Heráclito e viram que ele estava se aquecendo perto do fogão da cozinha, hesitaram em entrar; mas ele pediu que eles não tivessem medo de entrar, pois mesmo naquela cozinha os deuses estavam presentes. Da mesma forma, devemos nos aventurar ao estudo de todos os tipos de animais, sem repugnância; pois cada um deles nos revelará algo de natural e algo de belo" (ARISTÓTELES, De partibus animalium, livro 1, capítulo 5, 644b 21 - 645a 23).

Para Aristóteles as coisas da Terra eram tão admiráveis e relevantes quanto as coisas dos céus. Em última análise, arrisco-me a dizer que O Estagirita instituiu uma abordagem teleológica, através da pesquisa devotada à finalidade última das coisas. Este enfoque continuou no pensamento biológico no século XX.


Além de classificar animais e plantas na natureza, Aristóteles também foi o primeiro a definir e classificar os vários ramos do conhecimento em: física, metafísica, retórica, poética e lógica. Ao fazer isso, disseminou os alicerces da maioria das ciências.


Principais obras de Aristóteles

- Ética e Nicômano
- Política
- Órganon
- Retórica das Paixões
- A poética clássica
- Metafísica
- De anima (Da alma)
- O homem de gênio e a melancolia
- Magna Moralia (Grande Moral)
- Ética a Eudemo
- Física
- Sobre o Céu
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Referências
 

ARISTÓTELES. Da alma. Tradução de Carlos Humberto Gomes. Lisboa: Edições 70, 2001.

ARISTÓTELES. Partes de los animales. Marcha de los animales. Movimiento de los animales. Introdução, tradução e notas de Elvira Jiménez Sánchez-Escariche y Almudena Alonso Miguel. Madrid: Editorial Gredos, 2000.

BONNARD, André. Aristóteles e os seres vivos. A civilização grega, Lisboa: Estúdios Cor, v. 3, p. 149-178, 1972. Disponível em: http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/opombo/hfe/momentos/escola/liceu/aristoteles_seresvivos.htm. Acesso em: 18 mar. 2012.

CUVIER, Georges. Histoire des sciences naturelles, depuis leur origine jusqu'à nos jours, chez tous les peuples connus. Ed. Magdeleine de Saint-Agit. Paris: Fortin, Masson. 1841-1845. 5 v.

LAERTIOS, Diogenes. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. Tradução de Mario da Gama Kury. Brasília: Universidade de Brasilia, 1988.

MARTINS, Roberto de Andrade. Aristóteles e o estudo dos seres vivos. Disponível em: http://www.ghtc.usp.br/server/PDF/ram-Aristoteles-livro.PDF. Acesso em: 18 mar. 2012.

MENDES, R. Teixeira (Conferência). A preeminência social e moral da mulhér: segundo os ensinos da verdadeira siência pozitiva. Rio de Janeiro, 1908, p. 5.

SAPPHO. Safo de Lesbos. Texto bilíngüe grego-português. Tradução de Pedro Alvim. São Paulo: Ars Poetica, 1992.

WORLD of Physics on Aristotle. Disponível em: http://www.bookrags.com/biography/aristotle-wop. Acesso em 18 mar. 2012.

Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Enviado por Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz em 18/03/2012
Alterado em 08/06/2018
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