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Transexualidade e jurisprudência
- análise de caso concreto -
 

Resumo
 
Analisa sentença judicial, relacionando as características metodológicas e principiológicas da hermenêutica constitucional encontradas na sentença em estudo: abertura, dialógica, pragmatismo, normatividade, dando destaque para os princípios da unidade axiológica, proporcionalidade, integração social, força normativa constitucional. Trata de tema emergente na Teoria do Direito, voltado à análise das perspectivas que se colocam para o campo jurídico e que está a exigir uma reflexão especial no momento histórico.

Palavras-chave e/ou descritores: Transexualidade. Hermenêutica Jurídica. Princípios constitucionais. Dignidade da Pessoa Humana.
 
1 Insuficiência dos métodos de interpretação tradicionais
 
A evolução constante e rápida da sociedade faz sentir a necessidade de aplicação de novos caminhos interpretativos, estes não mais supridos pelos métodos clássicos desenvolvidos a partir da reflexão positivista.

Surge, nos dias de hoje, a necessidade de conferir efetividade às normas constitucionais, através de uma interpretação de normas-princípios e normas-regras. Com relação às normas-regras, o grau de abstração e de abertura semântica é encurtado; quanto às normas-princípios, pelo seu alto grau de complexa abstração, provoca a necessidade do estabelecimento de uma nova hermenêutica. Os princípios constitucionais são normas jurídicas que concentram diversos valores jurídicos, cuja concretização não exclui a aplicação de outro princípio, porém há uma ponderação de bens para solução do caso concreto. Os princípios, por se justaporem a diversas situações, condicionam as regras constitucionais e as normas infraconstitucionais, pois compõem a unidade axiológica da Constituição. As regras delimitam os fatos, enquanto os princípios concentram valores jurídicos e promovem um conjunto indefinido de conseqüências no sistema jurídico.

As constituições do mundo contemporâneo ultrapassam as barreiras do liberalismo clássico, onde as regras retratam simplesmente o poder na forma detectada a partir da própria realidade, não se contrapondo a constituição e os casos em concreto.

Quando as constituições passam a estabelecer normas programáticas, que, por se dissociarem da realidade, não gozam de efetividade plena, geram um método interpretativo diferente daquele utilizado no sentido de instituir o dever-ser propriamente dito.


Konrad Hesse (1991) discute esta problemática, atendo-se à efetividade das normas constitucionais, na busca de maior efetividade. Apesar de reconhecer o significado dos fatores históricos, políticos e sociais para a força normativa da Constituição, Konrad Hesse enfatiza o aspecto da vontade de Constituição. A Constituição transforma-se em força ativa se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se se fizerem presentes, na consciência geral (especialmente na consciência dos principais responsáveis pela ordem constitucional), não só a vontade de poder, mas também a vontade de Constituição.

A dificuldade de oferecer normatividade ao texto constitucional traz a lume a necessidade de uma nova hermenêutica.

Os novos métodos de interpretação são de essencial relevância quando se trata de dirimir os questionamentos resultantes do imperativo de superação da metodologia dogmática clássica e do implemento da função social promovida pelo intérprete-juiz, que não deve perder, ao tentar aproximar o direito da realidade, o viés teórico-científico peculiar ao órgão que personifica.

Essa proposta repercute diretamente no Direito Constitucional, sendo de tempos pretéritos a procura de equilíbrio que permita suavizar a austeridade da Constituição defronte às transformações sociais, no afã de evitar que se torne anacrônica e petrificada, e ao mesmo tempo preserve a Lei Magna das transformações inconstitucionais passíveis de ocorrer quando são utilizados determinados artifícios interpretativos.

Com relação ao caso em estudo, em terras brasileiras, não existem regras jurídicas específicas que autorizem a mudança de nome do transexual operado, permanecendo o tema no campo da previsão legislativa. Neste sentido, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 70, de autoria do Deputado paulista José de Castro Coimbra, propondo alterações no artigo 129 do Código Penal e no artigo 58 da Lei dos Registros Públicos, acatando a mudança do prenome e do sexo do transexual em seu registro de nascimento e na carteira de identidade. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, reunida em 10 de maio de 1995, foi favorável ao projeto, fazendo a ressalva de que não devesse constar nenhuma menção ao sexo na nova carteira de identidade, pois, se assim não o fosse, continuaria o transexual a sofrer discriminação e exposição constante a situações ridículas.

A realidade se põe aos olhos do observador e não mais se pode dizer que se fala de ficção científica. Ao transexual, ser humano cuja alma se encontra em desarmonia com o corpo, oferece a medicina o alento da transformação. A partir de então, os princípios constitucionais sobrelevam em benefício da pessoa humana.
 
2 Análise de abertura
 
A decisão judicial em estudo não traz uma fundamentação teórica que mereça aplausos, abordando muito superficialmente a questão sob o ponto de vista ético e moral. A interpretação proposta é aberta, porque a situação não se vincula a norma alguma. Parte-se do caso concreto para depois encontrar o resultado e, somente então, vincular este resultado à norma.
 
3 Análise dialógica
 
A abordagem dialógica - baseada numa visão social de constituição do homem e da linguagem - traz inicialmente um levantamento bibliográfico do pensamento de diversos cientistas a respeito da mudança de nome do transexual, analisando-se criticamente a forma como foram entendidas as contribuições da Medicina, da Psicologia e do Direito.

Demonstra que a transexualidade refere-se a uma afecção que tem existido em todos os tempos, raças e culturas. Mostra que a postura de alguns cientistas, ultrapassada e divorciada da realidade social e humana, dificulta uma classificação científica aos transexuais, fazendo com que sejam estes muitas vezes confundidos com homossexuais e travestis. Em razão disso, traz algumas distinções. O transexual primário ou verdadeiro é aquele indivíduo que possui a convicção inabalável de pertencer ao sexo oposto ao constante em seu registro de nascimento, o que constitui pré-requisito para que a medicina venha a adequar-lhe a genitália. O transexual secundário, falso ou transitório, representa uma trans-homossexualidade que revela alternadamente fases de atividade homossexual e de travestismo que o faz gravitar na órbita do transexualidade, apresentando impulsos transitórios e ocasionais de transexualidade. O transexual verdadeiro possui o desejo de manter relações heterossexuais, afastando-se, normalmente, da prática homossexual. Repele e sente envergonha de ostentar os órgãos genitais. A homossexualidade, por sua vez, limita-se, apenas, ao sexo. Consiste num desvio do impulso sexual erótico do indivíduo, em direção àquele que exibe um corpo igual ao seu. Não pretende o homem ser mulher, nem a mulher tornar-se homem. Não pretendem, os homossexuais, a extirpação da sua genitália, tendo em vista ser o foco do seu erotismo, a relação sexual entre dois homens ou duas mulheres. Os travestis, da mesma forma, não cogitam da remoção dos órgãos sexuais que se constituem em zonas erógenas.

Acrescenta-se, neste momento, que a Associação Paulista de Medicina (RT, v. 545, p. 356) oferece a seguinte conceituação: “[...] transexual é o indivíduo com identificação psicosexual oposta aos seus órgãos genitais externos com o desejo compulsivo de mudança dos mesmos.”

Por diversas formas, demonstra o Relator Boris Kauffmann que a maior parte dos estudos científicos comprovam estar a sexualidade humana ligada a um aspecto biológico e outro psicocultural, donde se retira a análise sintética de que seja o transexual o indivíduo que se identifica como pertencente ao sexo oposto, experimentando grande frustração ao tentar expressar-se através do sexo que lhe determinaram os próprios genes.

No caso em estudo, concluem os peritos ser o autor um transexual primário.
 
4 Análise pragmática
 
Um estudo de caráter pragmático possibilita ao intérprete da área jurídica partir do caso em concreto, fazendo o movimento inverso dos métodos tradicionais, que partem da norma para se chegar ao caso concreto. É o que se vê a partir da decisão judicial exarada a partir do caso em epígrafe, para o qual não existem regras jurídicas específicas. A discussão está em vislumbrar-se um consenso no meio dos pontos de vista encontrados para o evento concreto.

Observa-se do texto judicial em análise que a cirurgia de mudança de sexo relaciona-se ao indivíduo que não anseia simplesmente mudar de sexo. Esta adequação lhe é imposta de forma irresistível e, portanto, invoca aos tribunais por corrigir as conseqüências do capricho da natureza que o trouxe à vida desta maneira intrigante que faz seu físico e espírito diferentes e inconciliáveis. Almeja apenas colocar sua aparência física em harmonia com seu verdadeiro sexo, pretendendo acertar o consternativo e indesejável “desencontro entre alma e corpo” (MOTA, 1999).
 
5 Análise normativa e axiológica
 
No Brasil, o Conselho Federal de Medicina, em setembro de 1997, autorizou a título experimental cirurgias de transgenitalização para tratamento de transexualidade (CLEINMAN, 1998, p. 10). Até então, essas cirurgias eram feitas clandestinamente, passíveis de terem sanções penais por mutilação.

A exemplo disso, o Direito não se pode quedar indolente, destacando o Relator Boris Kauffmann que: “A alteração da indicação do sexo necessita exame mais cuidadoso.”

Realmente, os transexuais exercem direito próprio, sem ofensa a direito alheio, objetivando melhorar a saúde, na busca da dignidade humana. Sendo assim, não poderia o julgador manietar-se a símbolos e costumes superados, como vem ocorrendo com os direitos existenciais que se insurgem a reclamar urgente tutela.

O direito a que apelam os transexuais - o do direito à adequação de sexo e prenome - encontra fundamento no direito ao corpo, no direito à saúde, proclamado nos artigos 6º, 194 e 196 da Constituição Federal de 1988 e, mormente, no direito à identidade sexual, a qual integra um poderoso aspecto da identidade pessoal (VIEIRA, 1996, p. 22). Deve-se ainda ressaltar que integra a liberdade sexual a faculdade do indivíduo resolver a respeito de sua orientação sexual e, igualmente, de externá-la. O indivíduo, através do sexo, posiciona-se no mundo como ser humano social, pertencente a uma família na qual desenvolve suas funções de acordo com o sexo ao qual se sinta adequada a sua personalidade. Eis o cerne da questão.

O texto jurisprudencial invoca a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, que dispõe sobre os registros públicos, deixando evidente que, como regra, o assento de nascimento é inalterável. Preceitua seu artigo 58 que “o prenome será imutável”, abrindo exceções ao erro de grafia (artigo 58, parágrafo único) e aos nomes capazes de expor a ridículo seus portadores (artigo 55, parágrafo único). Permite a lei seja retificado qualquer outro elemento do assento, e, mediante ordem do juiz (artigo 109), possível a alteração do sexo. Retificar, aqui, coloca-se no sentido de corrigir, superar o erro.

Quanto ao caso em concreto, não se pode desconhecer que a desconformidade entre o prenome e o aspecto físico do autor somente ocorre em razão das transformações provocadas pela cirurgia plástica e pela postura do autor na sociedade, vestindo-se e agindo de maneira não condizente com o seu sexo.

Reconhece o Relator Boris Kauffmann, a necessidade de suavizar a letra fria da lei, adaptando-a ao caso em concreto, através da aplicação do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, além do reconhecimento da necessidade de preservar a intimidade e a honra do autor, abaladas pela exposição ao medo da chacota social. O direito à felicidade, desconhecido dos textos jurídicos brasileiros, é exaltado, como direito fundamental da pessoa humana.

Indexado como princípio fundamental da República Federativa do Brasil, no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal de 1988, a dignidade da pessoa humana é um dos mais relevantes princípios da legislação nacional. Embora o termo dignidade possua um conteúdo moral, preocupou-se o legislador em proporcionar às pessoas condições para uma vida digna, mormente no que tange ao fator econômico. Visa o termo, também, a condenação de práticas como a tortura, sob todas as suas modalidades, o racismo, e outras humilhações tão corriqueiras nos dias atuais.

Cabe ressaltar que através da observância do princípio da dignidade, o ser humano é visto como um fim em si mesmo, devendo ser respeitados os chamados direitos da personalidade, tutelados em cláusula geral no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988: “[...] são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas [...]”. Este dispositivo pode apresentar-se como uma regra-princípio, a expressar o impedimento de intervenção do Estado na esfera privada das pessoas, quando não prevista em lei ou se não for necessária à realização dos princípios antagônicos que, conforme o caso em concreto, tenham primazia frente ao princípio da inviolabilidade da intimidade e da vida privada.

A Constituição Federal de 1988, para além de trazer a liberdade como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, na tentativa de “construir uma sociedade livre” (artigo 3º, inciso I), traz em vários momentos a imagem da liberdade. É o que se depreende do caput do artigo 5º que proporciona: “[...] aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito [...] à liberdade [...]”, ou da “[...] livre manifestação do pensamento [...]” (artigo 5º, inciso IV), da “liberdade de consciência e de crença” e do “livre exercício dos cultos religiosos” (artigo 5º, inciso VI), da “livre expressão da atividade intelectual” (artigo 5º, inciso IX), do “livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão” (artigo 5º, inciso XIII), da “livre locomoção no território nacional” (artigo 5º, inciso XV), da “plena liberdade de associação para fins lícitos” (artigo 5º, inciso XVII). Neste contexto, pode-se afirmar que a Constituição Federal de 1988 traz expressamente o princípio da liberdade humana como parte dos “direitos [...] individuais e coletivos”.

Falar em liberdade significa referir-se à livre manifestação da vontade, sem interferência externa, desde que o exercício desta liberdade não signifique prejuízo para as demais pessoas. Sendo assim, o transexual é livre para realizar a cirurgia de redesignação de sexo, de acordo com sua própria vontade, sem ingerência de ninguém, nem mesmo do Estado, desde que a este cabe apenas vedar o estritamente imprescindível ao bem comum.

Não poderia o julgador afastar-se do texto constitucional, pois toda a ordem jurídica ali se origina. Contém a Carta Magna os princípios básicos norteadores do ordenamento jurídico positivo do país e, por tal razão, a interpretação de qualquer regra jurídica deve, sempre, levar em consideração o texto constitucional, culminância da pirâmide normativa. Todas as outras normas haverão de adequar-se à Constituição, cuja supremacia incide em não admitir uma eventual constituição legal paralela. A Constituição, enquanto lei fundamental, impõe-se ao próprio legislador que a deve dinamizar, sendo-lhe, entretanto, vedado subverter a ordem constitucional.

O meio de utilização dos argumentos jurisprudenciais examinados se traduz no fato de se estar sempre envolvendo o objeto em um âmbito de disparidades, sempre contrapondo os argumentos encontrados. Encontrada uma conclusão, analisa-se novamente, refutando um ponto com outro até se alcançar um consenso. Este é o método denominado Tópica Jurídica.

O objetivo do método tópico está em alargar o âmbito dos intérpretes, possibilitando uma maior pluralidade aos sujeitos da interpretação. Procura-se alcançar um número maior de sujeitos da interpretação no intuito de se atingir o consenso, a subsunção, que é a adequação da norma ao caso. Nos métodos anteriores à Tópica, a subsunção se fazia a partir da norma e desta partia-se ao caso concreto. Na Tópica, o ponto de partida é o caso concreto, alcançando-se uma solução, para em seguida adequar esta solução à norma. Percebe-se um efeito invertido. A Tópica harmoniza a norma à realidade, pois embora a norma estivesse antes presente, no momento da sua aplicação ao caso concreto, não se adequava corretamente, ocorrendo sérias disparidades.

A decisão do julgador do caso apresentado não se insere nos conceitos de arbitrariedade, nem se perde no subjetivismo exagerado, porque busca uma conciliação entre o método tópico e o sistemático, havendo-os como complementares. Não exclui da interpretação tópica a aplicação do modelo sistemático e não extrapola os limites da razoabilidade interpretativa.
 
6 Nosso pensamento a respeito do tema
 
O Direito não pode permanecer alheio ao desenvolvimento da ciência nem às conseqüentes evoluções históricas do pensamento, da cultura e da ética em uma sociedade em constante transformação. Como fenômeno histórico submetido a um infindável processo de adequação às reivindicações de um corpo social que evidencia, a todo o momento, novos valores, deve-se reconhecer os ensinamentos da ciência médica e admitir juridicamente que se o autor é transexual, não pode ser obrigado a suportar a torturante realidade vivenciada, pois tem o direito constitucional à saúde plena e não pode ser submetido a tratamento desumano e cruel, fazendo jus ao direito de submeter-se à cirurgia de mudança de sexo. Para além disso, considera-se que é direito da pessoa humana a procura da felicidade, para nós, implícito no texto constitucional, a partir do reconhecimento da Dignidade da Pessoa Humana como princípio basilar do Estado Democrático de Direito.

Referências

ASSOCIAÇÃO Paulista de Medicina. Transexualismo. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 545, p. 356.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (5. Câmara). Civil. Apelação Cível nº 165.157.4/5. Apelante: **** ******. Apelado: Ministério Público. Relator: Desembargador Boris Kauffmann. São Paulo, 22 de março de 2001. Votação unânime.

CLEINMAN, Betch. Mudança de sexo: meios legais e cirúrgicos. O Globo, Rio de Janeiro, 2 maio 1998. Rio, p. 10.

HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Tradução por Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1991. 34 p. Tradução de: Die normative Kraft des Verfassung.

MOTA, Sílvia Maria Leite. Da bioética ao biodireito: a tutela da vida no âmbito do direito civil. 1999. 308 f. Dissertação (Mestrado em Direito Civil)-Faculdade de Direito, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1999. Orientador: Prof. Dr. Vicente de Paulo Barretto. Centro de Pesquisa Jurídica Sílvia Mota, Rio de Janeiro. Disponível em: <http://www.silviamota.com.br>. Acesso em: 9 abr. 2005.

VIEIRA, Tereza Rodrigues. Direito à adequação de sexo do transexual. Revista Literária de Direito, São Paulo, p. 22, set./out. 1996.
 

Caso em estudo
 
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (5. Câmara). Civil. Apelação Cível nº 165.157.4/5. Apelante: ***** **********. Apelado: Ministério Público. Relator: Desembargador Boris Kauffmann. São Paulo, 22 de março de 2001. Votação unânime.
 
Registro civil. Pedido de alteração do nome e do sexo formulado por transexual primário operado. Desatendimento pela sentença de primeiro grau ante a ausência de erro no assento de nascimento. Nome masculino que, em face da condição atual do autor, o expõe a ridículo, viabilizando a modificação para aquele pelo qual é conhecido (Lei 6.015/73, artigo 55, par. único, c.c. artigo 109). Alteração do sexo que encontra apoio no artigo 5º, X, da Constituição da República. Recurso provido para se acolher a pretensão. É função da jurisdição encontrar soluções satisfatórias para o usuário, desde que não prejudiquem o grupo em que vive, assegurando a fruição dos direitos básicos do cidadão.
1. Cuida-se de ação de conhecimento tendo por objeto a alteração do assento de nascimento do autor, tanto em relação ao nome como ao sexo. Fundamenta-se no fato de ser transexual, tendo se submetido a cirurgia plástica para adequar seu sexo físico ao psicológico. Com relação ao sexo indicado no assento, formulou pedidos alternativos: a supressão da indicação masculino, substituindo-se por feminino, ou então por transexual feminino.
A sentença de fls. 68/72, cujo relatório é adotado, com a declaração de fls. 76, desacolheu a pretensão apoiando-se na inexistência de erro na lavratura do assento de nascimento, impondo ao autor os ônus da sucumbência, com a observação de ser ele beneficiário da assistência judiciária.
Apelou o autor buscando a reforma da sentença, com o acolhimento de seu pedido de alteração do assento de nascimento.
Sustentou que a utilização de seu nome o expõe a situações embaraçosas.
Salientou que não se pode fechar os olhos para uma realidade, qual seja, a de que não mais possui as características do sexo masculino, mas, sim, as do sexo feminino. Em relação ao nome constante do registro, acrescentou que o princípio da inalterabilidade não é absoluto (fls. 78/86).
Recebido o recurso, o Ministério Público, em contra-razões, admitiu o provimento parcial apenas para deferir a alteração do nome, mantida, no entanto, a indicação do sexo masculino (fls. 88/89).
A Procuradoria Geral de Justiça, através do parecer da Dra. Leila Mara Ramacciotti Vasconcellos, opinou pelo provimento integral do recurso, alterando-se o nome e o sexo o assento de nascimento do autor (fls. 93/102).
2. Autorizado pelo artigo 46 da Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973, o assento de nascimento do autor foi feito apenas em 20 de dezembro de 1979, quando este já tinha 13 (treze) anos. Tendo sido declarante a mãe, indicou ela ao oficial o nome completo do registrando - ****** ****** ************ ** ********* - e que o seu sexo era masculino (cf. doc. fls. 13).
Submetido a perícia médica nestes autos, realizada no Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo - IMESC -, constatou-se que o autor apresenta “mamas bem desenvolvidas (com prótese de silicone”, “ausência de genitália masculina” e “presença de neo-vagina e vulva”. Ao identificar o sexo do autor, o perito, após destacar os vários critérios para tanto, concluiu: “[...] a mudança do registro do sexo é assunto filosófico, visto a discussão anteriormente feita sobre sexo, pois apesar de seus caracteres morfológicos e até psíquico, geneticamente sempre será do sexo masculino, pela presença dos cromossomos sexuais “XY”, que é imutável, associado à total impossibilidade de procriar, pois não tem testículos e nem ovários (espermatozóides e óvulos respectivamente)” (fls. 49/54). A avaliação psiquiátrica concluiu que o autor tem condições “de assumir plenamente sua natureza feminina”, anotando que, segundo seu relato, com 9 (nove) anos começou a notar as diferenças de atitudes e comportamentos, inclinados para a feminilidade, tendo tido seu primeiro namorado aos 12 (doze) anos, e, a partir dos 13 (treze) anos, a vestir-se como se menina fosse (fls. 55/56). A perícia concluiu que o autor é um transexual.
3. Pedro Jorge Daguer, em sua tese de mestrado apresentada ao Instituto de Pós-Graduação Psiquiátrica da Universidade Federal do Rio de Janeiro, citado por Antonio Chaves, esclarece que “por transexualismo masculino entende-se a condição clínica em que se encontra um indivíduo biologicamente normal (...) que, segundo sua história pessoal e clínica, e segundo o exame psiquiátrico, apresenta sexo psicológico incompatível com a natureza do sexo somático” (“Direito à vida e ao próprio corpo”, Ed. Revista dos Tribunais, 1994, pág. 141). Aracy Augusta Leme Klabin também define o transexual dessa forma: “é um indivíduo, anatomicamente de um sexo, que acredita firmemente pertencer ao outro sexo” (“Transexualismo”, in Revista de Direito Civil, vol. 17, pág. 27).
O transexual não se confunde com o travesti ou com o homossexual. No transvestismo, a característica principal é o uso de roupagem cruzada, por fetichismo ou por defesa; no homossexualismo, a identificação é feita pelo relacionamento sexual com pessoas do mesmo sexo. Também não se confunde com o hermafroditismo verdadeiro ou com o pseudo-hermafroditismo.
Esclarece, a respeito, Carlos Fernadez Sessarego: “El primero de ellos, como lo señala la literatura especializada es um síndrome que se caracteriza “por la presencia simultánea, em el mismo indivíduo, de la gónada masculina y de aquella femenina”, cuya coexistência “[...] influye, de modo variable, sobre la conformación de los genitales externos, el aspecto somático y el comportamiento síquico. El seudo hermafroditismo, tanto masculino como femenino, representa la carencia, en un mismo individuo, de homogeneidad entre los órganos genitales externos y el sexo genético. Esta situación se diferencia del transexualismo en tanto en éste no se presentan anomalías a nivel de la gonoda o en lo que atañe a los genitales externos” (“El cambio de sexo y su incidencia en las relaciones familiares”, in Revista de Direito Civil, vol. 56, pág. 7).
Costuma-se, além disso, distinguir o transexual primário do secundário.
“O primário compreende aqueles pacientes cujo problema de transformação do sexo é precoce, impulsivo, insistente e imperativo, sem ter desvio significativo, tanto para o transvestismo quanto para o homossexualismo. É chamado, também de esquizossexualismo ou metamorfose sexual paranóica.
O secundário (homossexuais transexuais) compreende aqueles pacientes que gravitam pelo transexualismo somente para manter períodos de atividades homossexuais ou de transvestismo (são primeiro homossexuais ou travestis).
O impulso sexual é flutuante e temporário, motivo pelo qual podemos dividir o transexualismo secundário em transexualismo do homossexual e do travesti” (Aracy Klabin, “Aspectos jurídicos do transexualismo”, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, vol. 90, 1995, pág. 197). Pode-se afirmar, portanto, que no transexual secundário, o transexualismo é o meio para a atividade homossexual ou de transvestismo, ao passo que no transexual primário, o transexualismo é o próprio fim.
Essa cisão entre o sexo somático e o sexo psicológico poderia indicar a terapia como tratamento para ajustar este último ao primeiro. No entanto, destaca Matilde Josefina Sutter ser “inócua qualquer tentativa no sentido de reconduzir psicologicamente o transexual ao seu sexo anatômico, uma vez que todas as técnicas psicoterápicas se mostram absolutamente ineficazes, nesse sentido, possivelmente devido à falta de cooperação do paciente, que rejeita o tratamento”.
E prossegue: “Afirmamos em outra ocasião, que nenhum argumento é capaz de demovê-lo, pois o 'transexual, em geral, na prática, não admite discutir essa situação, só o fazendo com vistas à mudança de sexo. Esta lhe é tão necessária que absorve todo o seu interesse, de modo a impedir o seu desenvolvimento pessoal'. O transexual se ofende e se revolta quando lhe indicam tratamento psicoterápico” (“Determinação e mudança de sexo - aspectos médico-legais”, ed. Revista dos Tribunais, 1993, pág. 115).
Esta insistência e imperatividade de ajuste sexual, característica do transexual primário, aliada à inocuidade do tratamento psicoterápico, é que levou muitos países a admitir o caminho inverso: a mimetização do sexo morfológico, procurando adequá-lo ao sexo psicológico, eliminando assim a causa da repulsa que conduz invariavelmente ao suicídio e à automutilação. Para o transexual primário, a solução é cirúrgica, como a realizada pelo autor, com a eliminação do pênis e do escroto e a construção de uma neo-vagina e vulva, além da implantação de próteses de silicone nas mamas, para dar aparência feminina, e eliminação do pomo de Adão, para retirar qualquer resquício do sexo morfológico.
4. O perito concluiu que, apesar das cirurgias a que se submeteu, o autor é, ainda, do sexo masculino. Tal conclusão, como se viu, baseou-se na presença dos cromossomos “XY”.
Sexo, segundo o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, é a “conformação particular que distingue o macho da fêmea, nos animais e nos vegetais, atribuindo-lhes um papel determinado na geração e conferindo-lhe certas características distintivas”.
É evidente que no fim do século retrasado, quando principiou a obrigatoriedade do registro civil, a distinção entre os dois sexos baseava-se na conformação da genitália. Lembra-se, sempre, de antiga propaganda em que duas crianças, um menino e uma menina olhavam para o interior de sua roupa para ver as diferenças entre eles. Mas, com o desenvolvimento científico e tecnológico, pode-se afirmar que, hoje, existem vários elementos identificadores do sexo, apontando Tereza Rodrigues Vieira os seguintes: o cromossômico ou genético; o cromantínico, o gonádico, o anatômico, o hormonal, o social, o jurídico e o psicológico (“Direito à adequação de sexo do transexual”, in Repertório IOB de Jurisprudência, n. 3/96, pág. 51). Adverte Aracy Klabin que qualquer dos critérios poderia ser tomado isoladamente para determinar o sexo da média das pessoas, podendo, no entanto, qualquer deles falhar em relação a alguns indivíduos (op. cit.., pág. 201).
No caso em exame, o único elemento dissonante era o sexo psicológico, pois, como transexual primário, o autor acreditava e acredita firmemente ter o sexo feminino, erroneamente envolvido num corpo masculino, que ele alterou. Como transexual e em face da crença firme do seu sexo feminino, o relacionamento sexual ocorre com pessoas do sexo oposto, ou seja, do sexo masculino, podendo-se dizer que o transexual masculino é um heterossexual, do ponto de vista do sexo psicológico.
5. A Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973, que dispõe sobre os registros públicos, deixa evidente que, como regra, o assento de nascimento é inalterável. No artigo 58 afirma que “o prenome será imutável”, abrindo exceções ao erro de grafia (artigo 58, par. único) e aos nomes capazes de expor a ridículo seus portadores (artigo 55, par. único). Permitindo a retificação de qualquer outro elemento do assento, mediante ordem do juiz (artigo 109), possível a alteração do sexo. Retificar, aí, está no sentido de corrigir, superar o erro.
Examina-se, primeiramente, o pedido de alteração do nome. Neste tema observa-se que, aparentemente, houve a tentativa da mãe do autor, declarante no registro de nascimento, para minorar o problema. O relato feito ao perito indicava que aos 13 (treze) anos o autor passou a vestir-se como menina, e ao efetuar o registro, tendo o autor 13 (treze) anos, a mãe incluiu, no prenome composto, o elemento “******”, tipicamente feminino, ao lado do elemento “******”, rigorosamente masculino. Mas, não se pode negar que o elemento “******” é causa de constrangimento para o autor, podendo expô-lo ao ridículo. Afinal, ****** foi o macho criado por Deus, segundo o Gênesis.
Adverte Spenser Vampre: “Quando pronunciamos, ou ouvimos um nome, transmitidos ou recebemos um conjunto de sons, que desperta em nosso espírito, e no de outrem, a idéia da pessoa indicada, com seus atributos físicos, morais, jurídicos, econômicos, etc. Por isso é lícito afirmar que constitui o nome a mais simples, a mais geral e a mais prática forma de identificação” (“Do nome civil”, ed. F. Briguiet & Cia., 1935, pág. 38).
Ao ouvirmos o nome “******”, a idéia que nos é transmitida é de alguém com atributos masculinos, chocando-nos quando essa expectativa não é correspondida. Até hoje chamamos de “Roberta” o famoso transexual Roberto Gambine Moreira, o qual, apesar de ter obtido sucesso em pedido idêntico feito perante a 8a Vara da Família do Rio de Janeiro, teve sua pretensão desatendida por força do julgamento da apelação interposta contra a sentença da Dra. Conceição A. Mousnier.
É chocante, para qualquer pessoa, referir-se a ele como “Roberto”, o que pode provocar risos e chacotas.
É verdade que essa desconformidade entre o prenome e o aspecto físico somente surgiu em razão das modificações provocadas pela cirurgia plástica e pela forma do autor se vestir e agir no meio social. Mas, como salientou a magistrada citada, “manter-se um ser amorfo, por um lado mulher, psíquica e anatomicamente reajustada, e por outro lado homem, juridicamente, em nada contribuiria para a preservação da ordem social e da moral, parecendo-nos muito pelo contrário um fator de instabilidade para todos aqueles que com ela contactassem, quer nas relações pessoais, sociais e profissionais, além de constituir solução amarga, destrutiva, incompatível com a vida” (transcrição de Antonio Chaves in “Direito à vida e ao próprio corpo”, 1994, pág. 160).
Portanto, ainda que não se admita o erro, não se pode negar que, com o aspecto hoje apresentado pelo autor, o prenome “******” o expõe a ridículo, autorizada a sua modificação pelo artigo 55, par. único, combinado com o artigo 109, ambos da Lei n. 6.515, de 31 de dezembro de 1973, inexistindo qualquer indicação de que a alteração objetive atingir direitos de terceiros.
E, tendo em vista que o autor vem utilizando o prenome “******” para se identificar, razoável a sua adoção no assento de nascimento, seguida do sobrenome familiar.
A alteração da indicação do sexo necessita exame mais cuidadoso.
Obviamente, como concluiu a perícia, as alterações sofridas pelo autor, com a extração do pênis e do escroto, a construção de uma neo-vagina e vulva, a implantação de próteses de silicone nas mamas e a redução do pomo-de-Adão, isto é, da saliência da cartilagem tireóide, não fizeram do autor uma mulher, no aspecto da capacidade de procriação. Dessa forma, a alteração poderá eventualmente viabilizar um casamento inexistente, se o autor contrair núpcias com um homem, já que, por enquanto, o ordenamento jurídico só reconhece o casamento de pessoas de sexos diferentes. Se se adotar, no entanto, como critério distintivo dos sexos o psicológico, aí o casamento existiria, mas, se o cônjuge ignorar o fato da transexualidade, quando de sua celebração, poderá ser anulado em virtude de erro essencial (Cód. Civil, arts. 218 e 219, I).
Como o erro no assento não existiu, em princípio a alteração não seria possível. No entanto, não se pode ignorar a advertência feita pelo magistrado Ênio Santarelli Zuliani, em brilhante voto vencido proferido na Apelação Cível n. 052.672-4/6, da Comarca de Sorocaba: “Como a função política do Juiz é de buscar soluções satisfatórias para o usuário da jurisdição - sem prejuízo do grupo em que vive -, a sua resposta deve chegar o mais próximo permitido da fruição dos direitos básicos do cidadão (artigo 5o, X, da Constituição da República), eliminando proposições discriminatórias, como a de manter, contra as evidências admitidas até por crianças inocentes, erro na conceituação do sexo predominante do transexual”. E, mais adiante, aludindo à dubiedade existente no portador da síndrome de identidade sexual, acrescenta: “A medicina poderá aliviar o peso da dubiedade, com técnicas cirúrgicas. O Estado confia que o sistema legal é apto a fornecer a saída honrosa e deve assumir uma posição que valoriza a conquista da felicidade ('soberana é a vida, não a lei', Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, in “O aprimoramento do Processo Civil como pressuposto de uma justiça melhor”, AJURIS 57/80), quando livre da ameaça de criar-se exceção ao controle da paz social”.
A tendência que se observa no mundo é a de alterar-se o registro adequando-se o sexo jurídico ao sexo aparente. O jornal “El Mundo”, edição de 18 de março de 2000, anunciou: “Um juez ordena el cambio de nombre del primer transexual operado por la Seguridade Social”. Embora a manchete aluda apenas à mudança do nome, a alteração envolveu também o sexo, esclarecendo que o Juizado n. 21, de Primeira Instância de Sevilha - Espanha -, ordenou a alteração do nome e do sexo de ******, o primeiro transexual operado na Espanha pela Previdência Social, acrescentando: “La sentença recoge que há quedado debidamente acreditado que Susana, antes Antonio, há 'assumido y ejercitado desde su infância roles claramente femeninos', que solo se han manifestado em su comportamiento, relaciones, o forma de vestir, sino que incluso lê llevaron a 'intentos de mutilación por la adversion y repugnância que sentia hacia sus órganos genitales masculinos, existiendo uma disociación entre tales órganos y sus sentimientos”.
Já na Declaração Universal dos Direitos do Homem, adotada e proclamada pela Resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, afirmava-se que a dignidade é inerente todos os membros da família humana. E a Constituição em vigor inclui, entre os direitos individuais, a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas (artigo 5º, X). Reside aqui o fundamento legal autorizador da mudança do sexo jurídico, pois sem ela, ofendida estará a intimidade do autor, bem como sua honra. O constrangimento, a cada vez que se identifica, afastou o autor de atos absolutamente normais em qualquer indivíduo, pelo medo da chacota. A busca da felicidade, que é direito de qualquer ser humano, acabou comprometida.
Essa preocupação é que levou esta 5ª Câmara de Direito Privado a admitir a alteração do nome e do sexo no assento de nascimento de ******, também transexual primário. Afirmou o acórdão - que curiosamente manteve a indicação de “transexual” como sendo o sexo do registrado - que “não se pode deixar de reconhecer ao autor o direito de viver como ser humano que é, amoldando-se à sociedade em que quer fazer parte. E não quer viver o autor como marginalizado, como discriminado, num estado de anomia e anomalia. Ele quer simplesmente merecer o respeito de sua individualidade, de ser cidadão, um indivíduo comum” (Apelação Cível n. 86.851.4/7, de São José do Rio Pardo, rel. Des. Rodrigues de Carvalho). E tem levado o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ao mesmo caminho (RTJRGS 195/356; Apel. Cível 59517893, rel. Des. João Selistre, julg. Em 28/12/95 pela 3a Câmara Cível.
A sugestão do Ministério Publico de primeira instância, de se alterar o nome, mantendo-se, todavia, o sexo masculino, é inadmissível. A integração na sociedade depende da acomodação do registro, sendo eventual ressalva - quer indicando o sexo masculino, quer indicando a condição de transexual - ofensora aos direitos fundamentais. A esse respeito, 2nd Circuit U. S. Coutr of New York admitiu que, segundo a Constituição Americana, os transexuais têm o direito constitucional de manter o sigilo de sua condição. A situação, aqui, é a mesma devido a garantia de resguardo da intimidade.
6. Em conseqüência, o recurso é provido para se determinar que no assento de nascimento n. **.***, lavrado em *** de****** de **** às fls. *** do livro A-** do Cartório de Registro Civil do ** ****** ** ******* (SP), seja alterado o nome, de “****** ****** ****** ** ******* para “****** ****** ********, bem como a indicação do sexo, de “masculino” para “feminino”.
Sem custas.
BORIS KAUFFMANN
Relator.
Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Enviado por Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz em 23/01/2011
Alterado em 20/11/2011
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