O amor do primeiro beijo
Bela, muito bela, na sala de aula. Apanhou um espelho de bolsa para olhar-se. Mas, o que viu, motivado pela força do destino, foi um rosto dotado de sorriso principesco. Não se olhou, mas viu-o. E estremeceu, da cabeça aos pés. Não estivesse sentada, cairia.
À saída das aulas fugiu num rebolado trêmulo, mas faceiro. O que se passou em sua mente nem ela mesma poderia decifrar. Muito menos na sua carne, aquela noite. O sono demorou a chegar. Pela manhã, não tomou o café. Mais tarde, após o banho de sabonete cheiroso, almoçou às pressas e vestiu o uniforme. Saia azul marinho de pregas e blusa branquinha com o logotipo da escola gravado no bolso que lhe tapava o seio esquerdo. Seio adolescente pequeno, lindo, bico rosado e duro. Passou os olhos na silhueta de contornos recém-inaugurados. Beijou a mãe e pediu a benção ao pai. Saiu correndo e, na esquina, parou para arrumar a saia, contra seu desejo, tão comprida. Enrolou-a até acima dos joelhos. Apertou tudo com o cinto largo que lhe espremia a cintura, deixando-a mais fina. Agora, sim. Caminhou sorrindo serelepe, mas diferente dos outros dias. A imagem ao espelho, da tarde anterior, era um fascínio de pudor e fervor da pele. Sentimento estranho aquele. O que seria?
Entrou na sala e apanhou o espelho, assim que a aula começou. Que medo de ver o que desejava ver! Sim, não fora imaginação. Lá estava o sorriso mais cobiçado da escola sorrindo-lhe de novo, a menear-lhe a cabeça. O que fazer? Abaixou o espelho rapidamente e segurou o coração com o pensamento. Batia forte no pescoço.
- Posso falar com você? Acompanhá-la?
Um arrepio frio percorreu-lhe a espinha, de ponta a ponta, com gosto e medo. A penugem dourada do corpo ouriçou-se.
- Meu pai... - ameaçou responder, sem fitá-lo de frente.
- Eu sei que seu pai é bravo. Mas, só quero ir com você até a esquina... tomaremos cuidado...
Não teve coragem de negar pedido a olhar tão sedutor! Os hormônios em alvoroço suplicavam que aceitasse. Mas, falar o quê, se lhe faltava até o ar?
Caminharam lado a lado, em silêncio. As coleguinhas alcoviteiras iam atrás admirando, invejando ou amaldiçoando, sabe-se lá.
A partir daquele dia seu primeiro namorado foi aquele príncipe encantado - loiro e lindo, meigo e doce... Dançaram "Se piangi se ridi" e, depois de muito tempo, ofereceu-lhe seu primeiro beijo...
Aquele beijo... ah!... Ergueu o pezinho esquerdo e, ao enlevo daquele momento, abriu-se o chão, voejou por entre estrelas... Depois, fugiu como um passarinho envergonhado. Beijara seu primeiro beijo! Precisava urgente contar para sua irmã. Não houve nem tempo e nem coragem de dizer ao amado: - Não mais viverei sem você, nunca mais! - Era preciso fugir, só isso!
Quase a correr, com o corpo de menina moça rebolando nervoso, naquele trotar de potranca nova, sentia medo, só medo! De quem? Sabe-se lá! De tudo! Medo do beijo, do amado, do mundo, do pai tão bravo! Medo de si mesma, agora que sentira o sabor do primeiro beijo. Antevia que dali para a frente se apaixonaria, sempre, ao primeiro beijo. Por isso, pela vida afora, ofereceu tanto cuidado ao beijar. Sofrimento, na certa!
Cabo Frio, 2009.
Enviado por Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz em 06/06/2010
Alterado em 19/08/2016