Arrogância intelectual e inveja poética
Este texto é um dos 100 primeiros colocados no Concurso Contos Curtos Via Literária 2009, num universo de 3517 concorrentes. Publicado em Antologia correspondente.
**************************************************************************************
Divino era “O Invejoso”, por natureza! Poeta, fixara-se em mim-poeta, esquizofrenicamente. Em tudo mereci censuras: fui retrógrado, inábil, mal amado e sonhador, pessimista infeliz e, até, um tarado sexual em potencial, desses que adoram meninas e meninos!
Talvez, Divino entendesse que o poeta pode ser um fingidor circunstancial, mas não sabia que o poeta nunca engana! E, ao sabor daquela confusão, expunha seu interior, quase sempre sujo e truão. Feio. Meu melhor amigo. Deixo isso bem claro! Gostava dele.
Pelas sendas dos 40 encontrava-o nas ruas macambúzio, jururu, voz macia e discurso arbitrário, a atrair moças ermas e carentes.
Certo dia escreveu “O Poeta”, no qual ignorou a significação universal do termo. Sob um título geral, expôs anseios e ações próprios. Restou das suas palavras um poeta robô, tolo que não pensa, não ama, não fode, não goza. Nenhuma virtude, nenhum prazer. Um nada. Noite alta – li e reli. Universalizara suas malquerenças. Quanta arrogância intelectual! Dores, tristezas, incertezas e inseguranças... Em tudo, Divino vomitara nos demais vates! O que entenderia de todos os poetas? Uivo de frustração. Deformidade. Não poesia.
Ao final, surpresa! Oferecera a mim, tal absurdo! Ah! Bufei! Sentei-me e escrevi, incontinenti. Sentimentos, numa rapidez demoníaca, escritos para um Divino carente de lições conexas à humildade poética. Planeei verso a verso, rima a rima, o “eu-poético” daquele abelhudo! Modéstia à parte, pela facilidade extraordinária que ostento para escrever qualquer coisa, foi-me fácil a vingança! Aquilo, sim, era poema! Um decassílabo-sáfico-heróico, observando a sonoridade nas 4ª, 6ª, 8ª e 10ª sílabas poéticas, acentuadas mais fortes, intitulado: “Tu, Poeta!”
Divino morreu. Acharam-no só, apodrecido, com um monte de folhas brancas a entupir-lhe a garganta. Mesmo brancas, fediam, também! Fico a pensar: inveja mata, mesmo?
Releio “Tu, poeta”. Perfeito!
Não admito arrogância intelectual! Muito menos, entre poetas... amigos!
Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Enviado por Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz em 06/06/2010